13 de mai. de 2011

Confessions of a bookaholic in treatment: - Parte 8


Em processo terapêutico.
Relatos de M.C.

10-02-2008

     "Aquilo arranhava dentro. Dentro do peito e nos pulmões, como unhas afiadas. Misturava a quentura no estômago que o colo da mãe dava com uma aspereza que antes não conhecia. Por vezes, explodia em frustração, era à hora do choro, se jogar no chão, a “cabeça em chamas”... Alguém por favor, alguém que possa consolar, mas a dor, o pânico, era mais forte que qualquer consolo. Em outras, a maldade era a válvula. Arranhar o rosto do irmão. Aquilo que não era nada, mas considerado tão precioso. E se eu estragar esse bebê? Então a preciosa serei eu? Mas nada disso; ele também é parte de mim, que eu odeio, mas amo e quero tanto. Meu. Não da minha mãe ou do pai, que nos deixaram a deriva aqui. Somos dois pedaços de um.

Outras vezes a aspereza era muita e vinha arranhando a carne de dentro para fora e, explodia prazer, que era escondido e dava vergonha. A mãe longe, a mãe perto. Quero sim. Que ame,ame,ame. Não quero. Quero o irmão que sofre comigo. Estamos sós. Mas o pai olha para ele. Ele não esta só e quero machucá-los, os dois. Quero que minha dor não seja só e se eu doer, talvez, se for tão explicita, talvez eles doam comigo, e eu não seja tão só. Onde está ela, que eu preciso de mãe. Que eu preciso ser a única, preciso ser a especial. Por favor. Por favor. Para alguém, qualquer. Preciso ser bonita, preciso me comportar. Não. Quero ser amada e vou quebrar o que vier e, quero ver se me ama se não amar, vou dizer: já sabia! E não vou ter nada. Mas vou ter razão. E vou berrar, berrar, berrar. Preciso saber se vocês vão ouvir.

Quero ser a prima, que é bonita e feliz. Quero aquele pai, que olha quando como macarrão. Mas isso é só brincar de ser. Por que eu, filha, não sou vista. Então, não sou."

24-02

A cena¹. Tesão. Por que dá tesão?

Porque é sexo, é estimulante e porque é proibido. A culpa de compactuar com o abuso, pois ele gera prazer. A sensação de gostar porque é errado me lembro à cena, em regressão à outra vida, que fui amante do C. e ele me matou. Eu tinha consciência de que aquela situação era ruim para mim e, exatamente por isso, era muito excitante.

Sexo na infância é um tabu que me assusta. Por quê?

Para casa: Exercício do perdão.

Sonho dois dias após esta sessão: Uma mulher feita de um material plástico, colorido. Ela tem parafusos na cabeça, articulações, etc. Um homem chega com uma chave de fenda, a beija na testa. Ela sorri. Ele começa a apertar um parafuso um pouquinho, ela faz uma cara de leve incômodo, mas sorri. Ele vai apertando todos os parafusos mais e mais. No rosto dela, o sofrimento aumenta. Ate que ela explode e se desfaz em fios tipo como macarrão de plástico azul. Sobra por inteiro, o sapato de salto.

28-02

Questão da terapia: O que seria e como seria o atributo de valor que conceitualiza a sintomatologia do trauma e ate que ponto ele está internalizado na pessoa que sou hoje?

"O atributo de valor: sentir tesão pelo pai é errado. A situação toda é depreciativa e ruim. Eu sinto tesão por situações que me colocam em uma posição desvalorizada, verdade. Entendo que não é assim, que não precisa ser assim. Mas sinto raiva de mim, sinto raiva do mundo, sinto raiva de minha mãe. Eu quero me libertar, quero mesmo. Mas eu não sei mais o que fazer. Penso no trauma, choro, penso em todos os valores atribuídos ali. Faço o exercício do perdão, sinto que estou melhor. Mas volto para esse padrão de me sentir miserável. Eu não agüento mais, eu não quero mais sentir tanta raiva, eu não quero que este mundo de fora continue me desapontando tanto. Eu não quero continuar atraindo essas pessoas, essas situações. A história com o M. continua me incomodando. O L. continua me incomodando. Eu sei que sou eu que estou incomodada e eles não tem nada a ver com isso. Mas eu não tenho mais ferramentas para lidar comigo. Eu não sei mais o que fazer. Racionalmente, eu entendi que esse vinculo tesão- depreciação acontece, entendi que não faz sentido. Entendi. Mas eu não sinto isso. Eu não vejo no mundo de fora opções que não sejam depreciativas. Eu penso nas minhas experiências e me deprimem as escolhas que eu fiz. Mas eu não vejo luz. Eu não vejo opção. Eu preciso de ajuda e ninguém parece disponível, ou capaz de ajudar. Eu só vejo escuro. É ruim."

Pai²: “Antes de tudo, é preciso que eu diga: te amo. Você foi horrível comigo. Você me ensinou a amar de um jeito doente e triste, mas ainda assim. Eu te amo. Mas você foi um grande sacana. Logo no meu édipo você inicia esse abuso cruel, horrível. Você deveria ser o adulto. Vocês não cuidaram de mim. Você e minha mãe. E agora, o que vou fazer com isso, me diz? Já perdi quase metade da minha encarnação assim, sofrendo, me torturando. Foi muito injusto, muito injusto. E agora, como eu resolvo a culpa de ter desejado você? Eu tenho medo de contar desse abuso para um namorado e ele achar que eu sou um monstro. Porque eu me culpo, eu ainda me culpo. Porque era uma parceira. Eu era mais forte, mais importante que minha mãe. Eu era sua amante. E passo a vida tentando me redimir com ela. E passo a vida querendo me ligar a outro homem que vá me redimir, que vá apagar a relação com meu pai. Mas é claro que eu tenho que ser submissa. Eu me sinto suja, gasta. Eu critico tanto mulheres que traem as amigas porque eu cometi a pior traição. E saber que eu tive gozo nessa relação, que eu tive desejo, é tão assustador, é tão monstruoso, que tenho que me afastar e ser espectadora disso tudo porque eu não posso entender, é demais. Eu não consigo lidar com isso. Eu não consigo me perdoar. Eu não consigo nem entender essas coisas. Eu sei, meu pai era o adulto, meu pai errou. Mas ele não está aqui, e ficou tudo para mim. Como todas as minhas relações, me restaram os cacos e a sujeira para limpar. E o abandono.” M.C

    Nota 1: A paciente relembrou durante uma sessão de hipnose e regressão de idade uma cena onde fora abusada pelo pai. Grande parte de sua terapia, desde então, fixa nos insights pós revificação traumática e exploração dos conteúdos relevantes para sua vida psíquica atual. 

    Nota 2: A paciente escreve um texto após a sessão onde a regressão acontece em seu caderno de notas. Um relato sobre como se sente em relação à sua fase edipiana e, especificamente,neste texto, ao pai.

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