19 de mai. de 2011



09-03
Fiz o exercício de projeção. Eu adulta, falo com a eu pequena. Na primeira vez, a eu pequena tem dificuldade de se deixar tocar. Depois de muita conversa a eu adulta explica o que você recebeu antes, que magoou tanto, que doeu tanto, não foi amor. Eu te amo. Meu amor não vai te machucar. Se eu me amar, não vai ser esse amor de decepção, de nojo e desprezo. Vai ser amor bonito, verdadeiro e que constrói. A pequena se deixou ser abraçada. Da cabeça dela, emanavam várias construções mentais sombrias, estranhas. Aos poucos, foi melhorando.

Trabalhando em terapia o atributo de valor: a prostituta¹.

         A prostituta é a que escolheu ser livre. Magoa a todos, inclusive a si mesma. Mas foge do destino pré-determinado, esposa, mãe e sofredora. A prostituta tem o controle de sua vida. Nela, ninguém manda. Mas isso a faz suja e ruim. Porque ela deveria ter liberdade para usufruir do corpo que é dela, mas não pode. Usufruir o corpo é feio, sujo, sujo. Mas por quê? A mulher que sabe ser inteira, sabe amar o corpo que tem, sabe aproveitar o sexo é forte. Ela domina qualquer homem. Os homens não gostam das mulheres fortes, é perigoso. Então, eles a chamaram um nome bem feio, bem carregado. Eles a disseram prostituta, eles a disseram sem valor. A prostituta só é errada, suja, porque os homens usam do seu serviço e vêem assim.
Mas ser prostituta tem pouco a ver com os clientes. Ela tem tudo a ver com o poder. Porque os homens as “desprezam”, mas as procuram. E a dona da situação é ela, sempre.
Mas ser mulher é querer um homem para amar? Porque a gente idealiza que a esposa é feliz? Ela não é isso é claro. Mas a prostituta, livre, poderosa, quer um homem, quer ser a esposa de alguém. Por quê? Nós aprendemos a ter medo da liberdade.



17-05
 
Em um aspecto, me sinto mesmo como a prostituta: bicho acuado, com medo do mundo. Mas não posso demonstrar medo, então arreganho os dentes. Tenho raiva de muita coisa, de muita gente. Tenho preconceitos e intolerâncias. Tudo mentira, tenho é medo. Tenho medo dos normais, dos equilibrados, dos que fazem parte. Porque eu não sou um deles, nunca serei e se eles me julgam, eu os julgo antes: são chatos, tediosos. São comuns.
E é impressionante como a vida toda tenho atraído aqueles à margem, inadequados. Os que vão me fazer sofrer. E eu realmente sinto, quando vejo alguém que parece adulto, equilibrado, que eu não mereço essa pessoa. Que essa pessoa nunca vai me querer. Eu já não agüento mais. Eu quero estar saudável. Estou cansada. Eu não agüento mais esse exercício, me sinto empacada nesse sentimento, nessa culpa. Sinto raiva da minha mãe, a culpo. Acho que ela é a parceira do sintoma, que me faz sentir raiva, me faz sentir culpa. Que me da um amor que me põe na situação de inadequada, de excluída. Não quero mais sentir essas coisas, não quero mais ser passiva, medrosa. Não quero mais ficar acuada. O sentimento da culpa, a sensação de ter feito errado já esta bem esvaziada. Faz muito menos sentido que antes. Mas fica essa irritação, esse habito do medo, da raiva. Pensei muito no meu pai esses dias, fico tentando esvaziar esses sentimentos todos em relação a ele, a minha infância. Sei lá. Hoje esta tudo confuso e eu sinto raiva, muita raiva.

Nota 1:  Durante esta fase da terapia, sugeri a paciente que fizesse uma pesquisa sobre a origem da palavra “prostituta” e deixo aqui um link de um artigo muito interessante que é descrito como “O martelo das feiticeiras” escrito por Rose Marie Muraro².  http://www.casadobruxo.com.br/textos/martelo.htm
Nota 2: Quem quiser saber um pouco mais sobre esta grande mulher e minha ídola clique aqui:
http://rosemariemuraro.blogspot.com/
 

16 de mai. de 2011

Confessions of a bookaholic in treatment: - Parte 9


 01-03 – Um filme "cutucando" um trauma.

     “Assisti a um filme chamado Preciosa¹. Nele o pai começa a abusar sexualmente da filha aos três anos.  O filme é chocante, horrível, assustador. Lógico, eu acabei me projetando muito, especialmente nesses dias. Foi depois dele que comecei essa choradeira sem fim. Estou triste pela minha vida. Estou triste porque essa descoberta de que só me dá tesão o que é depreciativo é tão óbvia e é tão triste. Estou assustada com o que fiz da minha vida. Eu fui por caminhos de decepção, de mágoa. Hoje, eu tenho 31 anos e nada que seja realmente, meu. No filme, a mãe também é abusiva com a filha e, no final, faz um discurso de como a filha roubou seu homem e como ela tinha que compensar a mãe. Fiquei muito doída da minha relação com minha mãe. Porque nós temos um vínculo estranho. E minha mãe sempre me apoiou. Mas muito para as más escolhas. Eu nunca tive uma mãe que dissesse: “pensa melhor, esse não é um bom caminho.” Em tudo ela me apoiou verdade. Hoje penso que meu pai, horrendo e babaca, pelo menos foi mais honesto. Ele me disse muitas vezes que eu tinha que ficar na faculdade, que o café não era uma boa idéia, coisas assim. Ele não deixa de ser um imbecil, mas pelo menos, é um imbecil pé no chão. Eu acredito que minha mãe me ama e me quer bem. Mas bem no fundo, ela tem um prazer em me ver falhar. Porque eu roubei o homem dela. Assim, eu tenho que ficar por perto. Estou sentindo muita raiva, muita mágoa. Estou assustada."

Preciosa e sua mãe.
Nota 1: – Preciosa - Uma História de Esperança. Um filme intrigante, realista e extremamente interessante. Vale a pena assistir.
                             Uma critica que achei super legal, vai ai o link para quem quiser:
                             http://www.passeiweb.com/saiba_mais/arte_cultura/cinema/leonardo_cinema_10_preciosa

13 de mai. de 2011

Confessions of a bookaholic in treatment: - Parte 8


Em processo terapêutico.
Relatos de M.C.

10-02-2008

     "Aquilo arranhava dentro. Dentro do peito e nos pulmões, como unhas afiadas. Misturava a quentura no estômago que o colo da mãe dava com uma aspereza que antes não conhecia. Por vezes, explodia em frustração, era à hora do choro, se jogar no chão, a “cabeça em chamas”... Alguém por favor, alguém que possa consolar, mas a dor, o pânico, era mais forte que qualquer consolo. Em outras, a maldade era a válvula. Arranhar o rosto do irmão. Aquilo que não era nada, mas considerado tão precioso. E se eu estragar esse bebê? Então a preciosa serei eu? Mas nada disso; ele também é parte de mim, que eu odeio, mas amo e quero tanto. Meu. Não da minha mãe ou do pai, que nos deixaram a deriva aqui. Somos dois pedaços de um.

Outras vezes a aspereza era muita e vinha arranhando a carne de dentro para fora e, explodia prazer, que era escondido e dava vergonha. A mãe longe, a mãe perto. Quero sim. Que ame,ame,ame. Não quero. Quero o irmão que sofre comigo. Estamos sós. Mas o pai olha para ele. Ele não esta só e quero machucá-los, os dois. Quero que minha dor não seja só e se eu doer, talvez, se for tão explicita, talvez eles doam comigo, e eu não seja tão só. Onde está ela, que eu preciso de mãe. Que eu preciso ser a única, preciso ser a especial. Por favor. Por favor. Para alguém, qualquer. Preciso ser bonita, preciso me comportar. Não. Quero ser amada e vou quebrar o que vier e, quero ver se me ama se não amar, vou dizer: já sabia! E não vou ter nada. Mas vou ter razão. E vou berrar, berrar, berrar. Preciso saber se vocês vão ouvir.

Quero ser a prima, que é bonita e feliz. Quero aquele pai, que olha quando como macarrão. Mas isso é só brincar de ser. Por que eu, filha, não sou vista. Então, não sou."

24-02

A cena¹. Tesão. Por que dá tesão?

Porque é sexo, é estimulante e porque é proibido. A culpa de compactuar com o abuso, pois ele gera prazer. A sensação de gostar porque é errado me lembro à cena, em regressão à outra vida, que fui amante do C. e ele me matou. Eu tinha consciência de que aquela situação era ruim para mim e, exatamente por isso, era muito excitante.

Sexo na infância é um tabu que me assusta. Por quê?

Para casa: Exercício do perdão.

Sonho dois dias após esta sessão: Uma mulher feita de um material plástico, colorido. Ela tem parafusos na cabeça, articulações, etc. Um homem chega com uma chave de fenda, a beija na testa. Ela sorri. Ele começa a apertar um parafuso um pouquinho, ela faz uma cara de leve incômodo, mas sorri. Ele vai apertando todos os parafusos mais e mais. No rosto dela, o sofrimento aumenta. Ate que ela explode e se desfaz em fios tipo como macarrão de plástico azul. Sobra por inteiro, o sapato de salto.

28-02

Questão da terapia: O que seria e como seria o atributo de valor que conceitualiza a sintomatologia do trauma e ate que ponto ele está internalizado na pessoa que sou hoje?

"O atributo de valor: sentir tesão pelo pai é errado. A situação toda é depreciativa e ruim. Eu sinto tesão por situações que me colocam em uma posição desvalorizada, verdade. Entendo que não é assim, que não precisa ser assim. Mas sinto raiva de mim, sinto raiva do mundo, sinto raiva de minha mãe. Eu quero me libertar, quero mesmo. Mas eu não sei mais o que fazer. Penso no trauma, choro, penso em todos os valores atribuídos ali. Faço o exercício do perdão, sinto que estou melhor. Mas volto para esse padrão de me sentir miserável. Eu não agüento mais, eu não quero mais sentir tanta raiva, eu não quero que este mundo de fora continue me desapontando tanto. Eu não quero continuar atraindo essas pessoas, essas situações. A história com o M. continua me incomodando. O L. continua me incomodando. Eu sei que sou eu que estou incomodada e eles não tem nada a ver com isso. Mas eu não tenho mais ferramentas para lidar comigo. Eu não sei mais o que fazer. Racionalmente, eu entendi que esse vinculo tesão- depreciação acontece, entendi que não faz sentido. Entendi. Mas eu não sinto isso. Eu não vejo no mundo de fora opções que não sejam depreciativas. Eu penso nas minhas experiências e me deprimem as escolhas que eu fiz. Mas eu não vejo luz. Eu não vejo opção. Eu preciso de ajuda e ninguém parece disponível, ou capaz de ajudar. Eu só vejo escuro. É ruim."

Pai²: “Antes de tudo, é preciso que eu diga: te amo. Você foi horrível comigo. Você me ensinou a amar de um jeito doente e triste, mas ainda assim. Eu te amo. Mas você foi um grande sacana. Logo no meu édipo você inicia esse abuso cruel, horrível. Você deveria ser o adulto. Vocês não cuidaram de mim. Você e minha mãe. E agora, o que vou fazer com isso, me diz? Já perdi quase metade da minha encarnação assim, sofrendo, me torturando. Foi muito injusto, muito injusto. E agora, como eu resolvo a culpa de ter desejado você? Eu tenho medo de contar desse abuso para um namorado e ele achar que eu sou um monstro. Porque eu me culpo, eu ainda me culpo. Porque era uma parceira. Eu era mais forte, mais importante que minha mãe. Eu era sua amante. E passo a vida tentando me redimir com ela. E passo a vida querendo me ligar a outro homem que vá me redimir, que vá apagar a relação com meu pai. Mas é claro que eu tenho que ser submissa. Eu me sinto suja, gasta. Eu critico tanto mulheres que traem as amigas porque eu cometi a pior traição. E saber que eu tive gozo nessa relação, que eu tive desejo, é tão assustador, é tão monstruoso, que tenho que me afastar e ser espectadora disso tudo porque eu não posso entender, é demais. Eu não consigo lidar com isso. Eu não consigo me perdoar. Eu não consigo nem entender essas coisas. Eu sei, meu pai era o adulto, meu pai errou. Mas ele não está aqui, e ficou tudo para mim. Como todas as minhas relações, me restaram os cacos e a sujeira para limpar. E o abandono.” M.C

    Nota 1: A paciente relembrou durante uma sessão de hipnose e regressão de idade uma cena onde fora abusada pelo pai. Grande parte de sua terapia, desde então, fixa nos insights pós revificação traumática e exploração dos conteúdos relevantes para sua vida psíquica atual. 

    Nota 2: A paciente escreve um texto após a sessão onde a regressão acontece em seu caderno de notas. Um relato sobre como se sente em relação à sua fase edipiana e, especificamente,neste texto, ao pai.

Confessions of a bookaholic in treatment: - Parte 7


 23.11

"Ah, não sei, não. Estou infeliz, angustiada, desencontrada. Quero ir embora, quero estar em qualquer lugar menos aqui. Não sei o que me aflige tanto, não consigo botar o dedo nessa angústia. Não sei se é ansiedade da mudança que vem que já passa da hora. Não sei por que essa vontade de partir é vontade de fugir de mim? Estou mesmo sentindo isso tudo ou é tudo fingimento?"
 24.11

"Tenho me evitado. Não olho no espelho, aquela que está lá não sou eu. Talvez seja mesmo a questão. Ficar mais magra me ajuda a sentir menos medo. É o medo que me faz infeliz. Tenho medo de não sobrar felicidade para mim. Tenho medo do julgamento dos outros. Tenho medo de mim, de ser feliz, de não ser. Quero muito mais que essa vida leviana, mas não sei se mereço. Mereço, sim, mas não sei o que acontece, uma angústia, uma insegurança. Sei lá." M.C
Clareece "Precious" Jones (Gabourey Sidibe) - atriz do filme Preciosa.


Confessions of a bookaholic in treatment: - Parte 6


21.11
     "Eu quero sempre partir. Nunca me senti em casa. Talvez, por um segundo, em Londres. Estou sempre querendo ir embora. E nunca chegando. Minhas viagens têm inicio, meio e chegam ao fim. Mas eu nunca chego a um destino, eu nunca chego ao encontro. Eu penso em estar só: penso em um tempo em que estarei satisfeita e não precisarei partir. E ao meu redor haverá silêncio e calma e o tempo não vai correr. Hoje pensei tanto no R. Hoje chorei porque vou ser divorciada. Não significa nada. Nunca fui de fato casada. Mas é um nome que não quero, não quero, não quero. Há muito tempo eu não me sinto realmente triste, o que é bom. Entendi que essa tristeza é toda fabricada e que não cabe mais. Mas tenho me sentido irritada o tempo todo. Não sei se é a L. e minha convivência, se é a iminência da cirurgia. Tenho sentido uma irritação que me domina. Acho que é a L. Sem ela é mais calmo. Ela me traz uma insatisfação, interessante. Ela me afasta de mim. Ando ciumenta de mim. Quero me ter só minha, mesmo que pouco. Mesmo que eu não saiba nem quem sou nem bem o que procuro. Enfim, enfim. Amanhã quero o dia só para mim."

 








22.11
 
   " Continuo me perguntando: por que quero tanto ir? É mesmo o trabalho, a falta de amor, a quantidade de mulher, a vidinha pequena? Ou é vontade de me esquecer? Quero a Inglaterra. Quero tanto. Quero outro lugar. "

M.C.